"Que o Senhor vos ilumine, abençoe e vos proteja."

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Arquivos Históricos do Alentejo inventariados em suporte digital..

Fátima Farrica (CIDEHUS-UÉ)
Francisco Segurado (CIDEHUS-UÉ)

FUNDIS (Fundos Documentais de Instituições do Sul) é uma base de dados para a descrição documental de fundos arquivísticos históricos de instituições do Sul de Portugal ou com informação de pertinência para os estudos do Sul.

A conhecida situação actual dos arquivos históricos portugueses, que em grande parte dos casos ainda se encontram por organizar, inventariar e acondicionar, ou com sistemas de organização, inventariação e acondicionamento deficientes ou desadequados – pese embora os significativos avanços dos últimos anos – continua a revelar-se, no século XXI, um entrave no acesso à informação documental. Informação esta que é imprescindível não só aos historiadores mas também aos profissionais de outras áreas do saber.
Conhecedores desse facto, pela própria experiência profissional, e deparando-nos amiúde com este obstáculo, enquanto membros colaboradores do CIDEHUS-UÉ (Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedades da Universidade de Évora) iniciámos a coordenação, a partir de 2009, da construção, da base de dados que aqui se apresenta. O objectivo primordial é contribuir para o atenuar das circunstâncias referidas, através da descrição, numa mesma plataforma, dos fundos documentais de cariz histórico e cultural produzidos e/ou acumulados por instituições do Sul do País ou com informação que, embora proveniente de outras regiões, serve os estudos sobre o Sul.

Desta forma, porque é o Alentejo o meio geográfico privilegiado por esta iniciativa, resolvemos apresentá-la através de um instrumento de divulgação e promoção cultural da cidade de Évora, com a publicação deste artigo no periódico Diário do Sul. Tal escolha revela-se ainda mais pertinente tendo em conta que grande parte da documentação já descrita na FUNDIS é proveniente de instituições históricas da própria cidade de Évora. Assim se visa, também, o estreitar as relações entre o meio académico (Universidade de Évora) e a região onde este se insere, dando a conhecer a Évora e ao Alentejo uma estrutura informática que pretende aglutinar em si o vasto património documental da região, existente nos vários arquivos históricos locais.

A cidade de Évora tornou-se, neste caso, o nosso centro de acção, por ter sido a partir dos seus importantes arquivos que se inaugurou a descrição documental na FUNDIS, mais especificamente com a separação virtual e com a catalogação do fabuloso núcleo documental de Pergaminhos Avulsos da Biblioteca Pública de Évora (BPE). Este conjunto é constituído, na sua grande maioria, por fontes documentais imprescindíveis ao desenvolvimento de estudos no âmbito da História Medieval, uma vez que o mais antigo documento aí encontrado remonta ao século XIII, mas alberga documentação que foi produzida entre aquele século e o século XIX, possuindo cerca de 2300 peças, quase exclusivamente em suporte de pergaminho.

Entre 2009 e 2010, a FUNDIS foi estruturada teoricamente pelos autores deste texto, e informaticamente desenvolvida por José Carlos Trancas, colaborador dos Serviços de Informática da Universidade de Évora, sob orientação e supervisão de Fernando Palma, então responsável pelo desenvolvimento dos portais web da mesma instituição.

O enfoque sobre a região Sul do País prende-se com o facto do programa científico do CIDEHUS se centrar, precisamente, nos estudos do Sul e também com razões de ordem prática, pois é nesta área geográfica que os investigadores do centro desenvolvem a sua actividade de investigação.

Actualmente, os objectivos de FUNDIS são: obviar a situações de extravio de documentos ao promover a descrição de núcleos documentais para os quais não há catálogos; divulgar a documentação existente nos diversos arquivos; disponibilizar à comunidade académica e aos investigadores, em geral, informação histórica dotada de uniformidade nos seus critérios de descrição; revestir-se de um carácter instrumental que facilite a pesquisa e a investigação histórica; incrementar a produção historiográfica; promover a existência de um repositório centralizador para descrição documental, com vista à criação de uma rede de informação que, apesar de ser oriunda de diferentes entidades detentoras e de diversos fundos documentais, se complemente em termos de conteúdo.

Podemos ainda acrescentar, como fim último, a sensibilização para a importância da preservação documental e o fomentar da organização dos inúmeros fundos documentais que ainda permanecem amalgamados e sem ordenação coerente.

A concepção desta base de dados obedeceu a dois princípios norteadores: Primeiro, foi concebida, na teoria e na prática, tendo em conta aquilo que se julgou serem as necessidades de pesquisa úteis aos investigadores. A óptica da sua concepção é a do investigador que procura saber que documentos existem para o estudo de determinado tema, instituição ou período cronológico e onde os poderá consultar. Desta forma, não pretende a descrição da documentação possuída ou à guarda de uma determinada entidade detentora, mas a descrição da documentação produzida por uma determinada instituição, independentemente da entidade onde está depositada ou das entidades pelas quais se encontra dispersa.

Segundo, foi estruturada de acordo com as normas e práticas arquivísticas vigentes , que se tentam aplicar até onde, actualmente, a realidade organizacional de alguma da documentação o permite.

Desta forma estruturou-se a base de modo a ser possível criar diferentes níveis hierárquicos de descrição documental. Estes devem reflectir a organização da própria documentação que, por sua vez, decorre das funções desempenhadas pelas instituições, das suas actividades, da sua orgânica administrativa e das opções de tramitação documental tomadas. Seguindo esta lógica, é possível criar na FUNDIS os seguintes níveis de descrição: Fundos, Subfundos, Secções, Subsecções, Séries, Subséries, Unidades de Instalação, Documentos Compostos e Documentos Simples.

Para cada um destes níveis criou-se na base uma ficha com diferentes campos de descrição documental que se baseiam nos elementos de informação que são indicados como pertinentes nas orientações para a descrição arquivística, considerando-se na FUNDIS a necessidade de uma maior minúcia descritiva nas fichas do documento composto e do documento simples, uma vez que é a este nível que a informação mais serve a investigação.

Ao nível do documento composto e do documento simples destacamos o campo designado Âmbito e Conteúdo, pois nele se regista um resumo de cada documento do qual fazem parte os dados que se consideram essenciais à apreensão do conteúdo do texto. Porém, podemos também optar por colocar neste campo a transcrição integral de um documento, o que permite o acesso, por parte do utilizador, a toda a informação aí contida.

Relativamente às potencialidades de descrição e de pesquisa da FUNDIS destaca-se, em primeiro lugar, a possibilidade de reconstituir virtualmente os fundos permitindo três soluções possíveis: 1 – descrever separadamente documentação com origem em diferentes produtores que se encontre indevidamente misturada; 2 – atribuir uma estrutura hierárquica orgânico-funcional à documentação de um só fundo que se encontre desorganizada ou apenas elencada; 3 – reunir virtualmente fundos dispersos por diversas entidades detentoras.

Em segundo lugar, é possível relacionar automaticamente qualquer unidade de descrição com qualquer outra com conteúdos complementares ou que façam parte de uma mesma tramitação processual.

Em terceiro lugar, criou-se uma funcionalidade que permite relacionar automaticamente documentos produzidos por uma instituição A, que contenham informações para a História de outra instituição B, com esta última. Esta função torna-se ainda mais fundamental tendo em conta que as vicissitudes dos séculos fizeram desaparecer, total ou parcialmente, os corpos documentais de alguns cartórios institucionais e, com isso, as fontes de informação necessárias ao estudo de determinadas instituições, temas ou realidades.

Em quarto lugar, existe a possibilidade de anexar a cada ficha de descrição de um documento a respectiva imagem digital para uma maior divulgação de conteúdo e como forma de evitar o manuseamento directo dos documentos. Contudo, esta funcionalidade ainda não está a ser utilizada e também não se pretende disponibilizar na base imagens de todos os documentos descritos, mas sobretudo dos mais antigos, perecíveis ou de conteúdo mais invulgar.

Ultimamente, na sequência dos objectivos citados de inventariar, divulgar e disponibilizar informação documental e de que esta faça uso de critérios de descrição uniformes decidiu-se, por hora, solicitar a colaboração das instituições que no Alentejo possuem fundos documentais de cariz histórico, onde se destacam, como é sabido, as câmaras e as misericórdias.

O que se pretende, por um lado, é disponibilizar a estas instituições uma ferramenta de descrição documental, de utilização gratuita, com vista a evitar que cada uma faça uso de um instrumento de trabalho diferente, com modalidades de descrição distintas; por outro, criar, agora sim, uma rede de suporte de informação que é formada pelos contributos individuais de cada instituição colaboradora, mas cujo conteúdo resultante serve a todos os participantes na mesma, e a qualquer investigador que dela queira fazer uso.

Assim, nos últimos meses, temos desenvolvido vários e constantes contactos com as autarquias locais e as santas casas da misericórdia que se têm mostrado bastante disponíveis a colaborar com o CIDEHUS no sentido de adoptarem a FUNDIS como instrumento de descrição a aplicar aos seus arquivos.

Tal significa que a FUNDIS não é um repositório estático de informação, mas sim, uma base de dados em constante carregamento de dados, quer pelos membros do CIDEHUS, quer pelos responsáveis dos vários arquivos locais.

Convém ressalvar que todo este esforço de inventariar, divulgar e disponibilizar a informação, não invalida, de modo nenhum, a consulta presencial nos arquivos, antes pelo contrário, pretende incentivá-la, ao dar a conhecer fontes documentais até agora total ou parcialmente desconhecidas dos investigadores.

Aproveitamos ainda esta oportunidade para dar a conhecer aos eborenses, e ao Alentejo em geral, que neste momento nos preparamos – através do CIDEHUS-UÉ, em parceria com o Cabido da Sé de Évora e com financiamento da Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito do concurso Recuperação, Tratamento e Organização de Acervos Documentais 2010 – para, durante o ano de 2011, proceder à reorganização, à inventariação e ao acondicionamento global de toda a documentação produzida e acumulada pelo Cabido da Sé de Évora ao longo de quase oito séculos de História e à consequente disponibilização da sua descrição on-line na FUNDIS.

Este acervo documental contém mais de 22400 peças, produzidas entre os séculos XIII e XX, que foram alvo de inventariações parcelares, que não abrangem a totalidade do fundo nem aplicam critérios de descrição uniformes. Considera-se, por isso, fundamental proceder a uma inventariação total, usando normas uniformes e actuais, em suporte digital com o objectivo da sua disponibilização on-line; digitalizar as peças mais relevantes, do ponto de vista informativo ou tendo em conta o seu estado de conservação; e criar condições de acondicionamento e preservação adequados.

O arquivo da Sé tem uma riqueza de informação única, especialmente no que respeita à história religiosa, mas também social, política e económica de toda a região Sul de Portugal.

Queremos ainda deixar aqui um agradecimento a todos os que de alguma forma ajudaram à construção da FUNDIS: ao Eng. Fernando Palma, ao Eng. José Carlos Trancas, ao Dr. Joaquim Serra, à Dr.ª Maria Lucília Teixeira, à Dr.ª Sílvia Mestre, ao Dr. António Castro Nunes, ao Dr. Manuel Branco e à Biblioteca Pública de Évora.

Sem comentários:

Enviar um comentário