"Que o Senhor vos ilumine, abençoe e vos proteja."

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

BELOS TEMPOS ! ! !

Decorria a década de 60/70 e ainda eu não sabia quem era. A cidade começava a sair dos seus velhos muros, para quem vivia no Bairro do Frei-Aleixo, ir à cidade queria dizer atravessar os campos cheios dos picos secos dos cardos. Para as crianças desse tempo ir à cidade era uma aventura. É que o Bairro, apenas com um largo e quatro ou cinco ruas, era um pequeno mundo, longe, donde mal se via o casario branco coroado pelas torres da Sé velha.
De Inverno, para ir à Escola de São Mamede, tinha que andar sozinho ou com as m/ irmãs, descalços, pisando a geada que caia de noite, entre poças,  lama e algumas molhas, cerca de um quilometro.
Estávamos em Junho, já me imaginava a caminho da feira de S. João com o m/ pai, minha mãe e m/irmãos. Estava feliz, não cabia em mim de contente. Naquele dia o calor era muito e muito mais era a gente, o pó e os sons dos altifalantes.
- Ai de nós se tentassemos entrar no Arcada descalços. Vinha logo a policia para nos meter medo. Mais tarde, nem na cidade já podiamos andar descalços.
Lembro-me que para ir à feira minha mãe tinha-me arranjado uns sapatos maiores que os pés, uns calções cinzentos abertos atrás para não ter trabalho quando a vontade apertasse, uma camisola azul celeste que quase me dava aos pés (resolvi a situação, enfiei-as por dentro dos calções) uns suspensórios de carneira e uns peúgos brancos. Ia vestidinho de novo, lavadinho (tomava banho no alguidar) e bem penteadinho.
Pela mão do meu pai comia tudo com os olhos. Recordo ainda a imagem do aguadeiro com uma cantara de barro, suando por todos os poros e vendendo copos de água a cinco tostões. Todos bebiam pelo mesmo copo. Só sei dizer que a gente fazia bicha para matar a sede.
Ali ou em casa, também se podia cortar o cabelo, pois o cigano que tosquiava os burros, fazia muitas vezes de barbeiro.
Vivi muito tempo com os cheiros a fritos e assaduras, fumos e muitas vozes.
Era a Feira de São João e São Pedro, centenária romaria de brincas, muito pó e água fresca. Recordo que os feirantes começavam a assentar arraiais na Escola dos Padres (Salesianos), mudando-se depois para o Rossio.  Vendia-se e comprava-se a pensar na invernia, comia-se até encher bem a barriga, bebia-se até perder a cabeça: churrasco, sardinha assada, massa frita, vinho tinto, muita cerveja.
Havia barraquinhas loiça, vidro, cestarias, tendas de roupa grossa, roupa fina, sapatos, máquinas, quinquilharia; tasquinhas de mil petiscos lojas de artesanato.
Ciganas e tendeiros ofereciam jogos de sorte e azar aos inocentes que por ali passavam: cartas, dados, matrecos, tiros, latas e os mais fortes não resistiam a entrar no poço da morte ou na casa do terror.
Meus amigos, era ouvir os barateiros vendendo a banha da cobra a chamar gente ao terreiro porque era tudo mais barato – por uma nota de cem, freguesa, leva um jogo de lençóis e três toalhas de servir à mesa.
À noite era a vez das bandas tocarem no coreto, enquanto no palanque cantavam ranchos, ouvindo-se o fogo de artifício.
As famílias iam ao circo, andar nos carroceis, carros de choque e nós, gaiatos, comíamos malacoecos e algodão doce. Onde não faltava também a cigana para nos ler a sina.

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