"Que o Senhor vos ilumine, abençoe e vos proteja."

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

AZARUJA, ERMIDA DE NOSSA SENHORA DO CARMO....

Azaruja. Nossa Senhora do Carmo. Milagres e ... a mula.
Os "milagres" parecem-nos muito ingénuos ou demasiado simples. Mas eram as coisas que contavam numa vida muito dura. Em 1754 (a fotografia tem reflexos mas dá para ver a inscrição).
Diz o ex-voto em linguagem popular:
Milaguer Q ~fes N.S Do Carmo; a Mel Fri~z Morna ilha Coutos da Villa de Arrayollos Q~ Estando Huma Noite No Campo com huma mulla saia; pastando Co ella O cometeo hum ladam, E lhe Deio. huma Facada na Barrigua; Q~ficou com as tripas na mão; e Foi a Srª SerVida. prndence o lladam com a mulla E le coubro. Sai de Por Feita E Ficou Livre da morte Anno de 1754.

Por outras palavras. Houve um milagre, porque um ladrão roubou uma mula que pastava, a Manuel (...) que estando uma noite no campos nas Ilhas, Couto de Arraiolos um ladrão lhe deu uma facada na barriga, tendo ficado o Manuel com as tripas na mão. E foi a Senhora do Carmo que fez prender o ladrão e lhe cobrou a dívida, isto é a mula e a saúde.
 Há vários aspectos interessantes.
1. A importância que tinha uma mula para o dono e o ladrão. A mula" era uma "máquina" importantissima para os trabalhos rurais; Sem a mula, que fazia trabalhos essenciais como alqueivar, lavrar, puxar um carro, etc. estaria em causa a economia do lavrador;

2. A existência de ladrões. No Alentejo, dada a distribuição da propriedade e a hierarquia social, havia sempre gente que não tinha lugar nesta sociedade, nomeadamente os "malteses" que existiam até há pouco tempo;

3. A resolução dos conflitos. A facada como modo de resolução destes;

4. A Senhora do Carmo, centro de romarias de uma larga região. Neste caso, em relação às Ilhas de Arraiolos; o "alvo" do milagre veio à Senhora do Carmo e não a outro lugar. Poderia eventualmente ir à Senhora de Aires ou à Senhora das Brotas, por exemplo;

5. A referência às Ilhas de Arraiolos em 1754. São mais antigas do que normalmente se diz e há que provar se efectivamente foram povoadas por colonos dos Açores, visto que a maioria das colonizações foram posteriores;

6. Estas terras eram coutos da vila, isto é seriam arrendadas temporariamente a famílias de pequenos lavradores.

7. A linguagem popular. Nestes ex-votos escrevia-se como se falava e como se presumia que se devia escrever. Há diferenças em relação à escrita erudita. Por exemplo não se escrevia "por feita" mas perfeita, nem "ladam" mas ladram ou ladrão.
Curiosidades;
Verifica-se que o pedido de protecção a Nossa Senhora do Carmo era feito, nos casos de doença, em primeiro lugar pelos membros da família doente, e nos casos de acidente, prisão, serviço militar, entre outros, o maior numero de pedidos é feito pelo próprio interessado; nos que estão relacionados com animais são os seus donos, muitas vezes marido e mulher, quem o apresenta.


Os motivos inerentes à oferta dos quadros estão relacionados com os seguintes assuntos:

1. Doença 1066

2. Acidente 102

3. Prisão 13

4. Serviço militar 35

5. Crime 3

6. Roubo 1

7. Incêndio 4

8. Animais – doença 7, acidente 10, roubo 10, desaparecimento 25, desconhecido 10.

9. Diversos 9

10. Desconhecidos 101

A seguir aos problemas relacionados com a saúde, o que mais preocupa os devotos são os que respeita aos seus animais, o que demonstra a sua importância na economia da região. Os animais mais referidos são: boi, burro, cavalo, égua, jumento, macho, mula, porco e vaca, no entanto, também há casos referentes a ovelhas, carneiros e outros, ou menções em termo gerais, como cavalgaduras, bestas, etc.

Os nomes mais usuais na região alentejana, sobretudo no sec: XX, são:

Masculino:

66 Antonios

41 Francisco

37 João

53 Joaquim

117 Josés

65 Manueis

Femininos:

26 Anas

20 Anónima

14 Catarinas

16 Franciscas

10 Gertrudes

16 Joaquinas

10 Josefas

24 Marias

23 Marianas

Aparecem alguns apelidos: 23 Correias, 20 Rodrigues, e 16 Rosados

Alem destes aparecem muitos outros que poderão ser alcunhas, com: Barbeiro, Pecurto, Raio, Migas, Pavia, Grilo

A maioria das cenas ocorre dentro dos quartos e relacionam-se com problemas de saúde. De um lado o doente, deitado ou sentado na cama, do outro nossa senhora do Carmo. Geralmente a roupa da cama é branca e a colcha é muitas vezes vermelha.

O cabelo das mulheres é, geralmente, apanhado em cima ou atrás da cabeça, a barba é pouco usual, mas muitos homens têm patilhas e aqueles que se julga ser o médico têm pêra.

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